Um impasse entre a Prefeitura de Regeneração e os feirantes da cidade promete transformar a terça-feira (25) em um dia de tensão. O cerne do conflito é a transição para um novo galpão municipal, que, em vez de ser recebido como uma solução, vem enfrentando resistência de vários comerciantes que se sentem ignorados e ameaçados em seu direito básico de trabalhar.
A história remonta a quatro meses, quando a administração municipal retirou as barracas tradicionais da frente do Mercado Público no centro da cidade. Na época, os feirantes foram realocados provisoriamente para a Praça Firmina Buji, com a promessa de que, em breve, um galpão coberto seria construído para acomodá-los com dignidade. A obra foi concluída, mas a realidade do novo espaço gerou uma polêmica que a prefeitura, segundo os feirantes, se recusa a dialogar.
A principal queixa é a imposição de bancas padronizadas de apenas 2 metros, que impediriam os comerciantes de levarem suas próprias estruturas, adaptadas ao volume e à natureza de suas mercadorias ao longo de anos, e até décadas, de serviço.
Feirante, Samia Nonata : 25 anos de feira, a voz da indignação
Quem melhor traduz a revolta e a frustração e muitos dos feirantes que trabalha, no local, é Samia Nonata dos Santos Silva, 25 anos de feira. Em entrevista ao portal, ela detalhou os pontos do conflito, que vão muito além de uma simples discussão sobre metros quadrados.
“A gente está correndo contra o tempo. Amanhã querem tirar a gente da feira. A Prefeitura vai estar lá com um caminhão para nos retirar as barracas da Praça Firmina Buji e levar para onde a gente quiser”, alerta Samia, descrevendo a pressão que os feirantes sentem.
O desejo da categoria, ela explica, não é se opor ao progresso.
“A gente quer trabalhar no galpão que a Prefeitura mandou construir… Queremos levar nossas barracas, nossas estruturas, porque tem espaço suficiente no galpão para colocar nossas bancas.”
As tentativas de diálogo, segundo Samia, esbarraram na intransigência do poder público.
“Já conversamos com o Antônio de Holanda, responsável pelo mercado. Ele levou nossa reivindicação para o Pedro Gato… que já tentou intervir junto ao prefeito, mas Seu Dua está irredutível… Mas não é assim que funciona. A gente trabalha, ninguém está pedindo favor para o prefeito, a gente só quer trabalhar.”
Injustiça, logística e riscos à saúde
Samia aponta o que considera uma incoerência gritante: a igualdade de custos para realidades desiguais.
“É injusto que uma pessoa que tem uma bacia de cheiro-verde pague o mesmo valor que uma pessoa que tem 40 caixas de mercadoria para expor e vender. Isso não é justo nem lógico.”
A solução proposta pelos feirantes é simples e demonstra disposição ao acordo:
“O que a gente quer é só levar nossas mercadorias, nossa estrutura de barracas que já temos para o novo galpão. Se precisar pintar para padronizar… a gente pinta.”

Além da questão financeira, há um problema logístico e de saúde pública. A prefeitura sugere que o excedente de mercadorias fique em caixas no chão. Samia questiona:
“Imagine uma idosa de 80 anos tendo que se agachar até o chão para pegar um produto. E uma gestante? Nós mesmos, que manuseamos as mercadorias, já sentimos o peso no corpo ao abaixar para levantar caixas de 20 ou 30 quilos. Isso vai causar transtornos físicos e, mais cedo ou mais tarde, lesões. Quem vai assumir a responsabilidade por esses danos?”
Histórico de remoções
A feirante lembra que esta não é a primeira vez que são realocados.
“A gente já foi jogado de um lado para o outro… e a gente seguindo as ordens da Prefeitura. E agora que o galpão está pronto … a gente não pode levar nossas bancas? Isso não tem lógica.”
Para Samia, a vida se confunde com a feira. “Minha vida foi a feira. Estou na feira há 25 anos e conheço essa realidade”.
“Desde que o mundo é mundo existe feira, mas só aqui em Regeneração eu vejo limitar o tamanho das barracas para todos de forma igual. Em outras cidades, existe o espaço cedido pela Prefeitura, e isso é válido, mas impor que todos tenham o mesmo tamanho não faz sentido. Cada feirante tem uma realidade diferente, depende, há lugares que dependo da mercadoria nem é cobrado imposto para o feirante”, revelou Samia
Os feirantes afirmam que, diante da falta de diálogo, pretendem levar a questão também à Câmara Municipal para que os representantes do povo, os vereadores, ouçam a reivindicação. Eles destacam que o tributo cobrado pelo município é proporcional ao espaço utilizado e alertam que, com a imposição de um tamanho único para todas as barracas, a Prefeitura deixará de arrecadar e ainda prejudicará quem precisa de mais espaço para trabalhar. Para os feirantes, essa medida não faz sentido e precisa ser revista.
Para formalizar e amplificar seu protesto, os feirantes de Regeneração organizaram um abaixo-assinado, no qual a categoria expõe, de forma fundamentada, os motivos pelos quais a determinação dos 2m² por barraca é inviável.
Leia o documento:
“ABAIXO-ASSINADO DOS BARRAQUEIROS DO MUNICÍPIO DE REGENERAÇÃO – PI
Nós, barraqueiros e comerciantes ambulantes que atuam no município de Regeneração – PI, vimos por meio deste solicitar à Gestão Municipal que seja revista a determinação que limita a área de trabalho dos barraqueiros a apenas 2m² por barraca.
A referida restrição inviabiliza a exposição adequada das mercadorias, impede a organização apropriada dos produtos, reduz o fluxo de clientes e compromete diretamente a renda das famílias que dependem dessa atividade para seu sustento. É importante destacar que, ao longo dos anos, sempre trabalhamos em espaços compatíveis com a quantidade e variedade de mercadorias, garantindo segurança, mobilidade e boas condições de atendimento ao público.
Reforçamos que o limite de 2m² não atende às necessidades reais da atividade comercial desenvolvida, tornando impossível montar uma barraca de forma adequada, segura e funcional. Tal medida, portanto, inviabiliza o exercício digno do trabalho e afeta diretamente a economia local.
Diante disso, reivindicamos o direito de trabalhar em um espaço adequado, sem restrições métricas que prejudiquem a atividade, permitindo assim que possamos continuar exercendo nosso trabalho com dignidade, organização e condições reais de sustento.
Confiamos na sensibilidade e no diálogo da Gestão Municipal para revisão da medida, a fim de garantir o pleno exercício do trabalho dos barraqueiros de Regeneração – PI.
Local e Data:
Regeneração – PI, ____/____/________.
Assinaturas dos Barraqueiros:
(Nome Completo | CPF | Telefone | Assinatura)”
Tentamos contato com o prefeito para falar sobre o assunto, mas não obtivemos retorno até o fechamento desta matéria. O espaço segue aberto para manifestação da gestão municipal.



