Em um evento que reuniu mais de 20 líderes mundiais, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, assinou oficialmente um acordo de cessar-fogo entre Israel e o grupo Hamas, encerrando uma guerra devastadora de dois anos na Faixa de Gaza. A cerimônia, realizada na cidade egípcia de Sharm el-Sheikh, foi marcada por discursos otimistas, gestos diplomáticos inesperados e uma promessa ousada: “Finalmente, temos paz no Oriente Médio”, declarou Trump.
Um cessar-fogo com peso histórico
O acordo, mediado por Estados Unidos, Egito, Catar e Turquia, marca o fim de um conflito que começou em outubro de 2023, com ataques do Hamas que deixaram mais de 1.200 mortos em Israel. A resposta militar israelense resultou em mais de 67 mil mortes em Gaza, segundo dados do Ministério da Saúde local, com milhares de civis entre as vítimas.
A primeira fase do plano envolveu a libertação de 20 reféns israelenses vivos e a entrega de quatro corpos de reféns mortos, além da soltura de 1.968 prisioneiros palestinos. A Cruz Vermelha atuou como mediadora na troca, que foi concluída na manhã de segunda-feira.
Trump entre aplausos e controvérsias
Antes de seguir para o Egito, Trump discursou no Parlamento israelense, tornando-se o primeiro presidente americano a fazê-lo desde George W. Bush. Ovacionado por parlamentares e pela população, ele declarou: “Este é o fim de uma era de mortes e terror. Um novo amanhecer para o Oriente Médio começa hoje.”
Em um gesto surpreendente, Trump pediu publicamente ao presidente de Israel, Isaac Herzog, que perdoasse o primeiro-ministro Binyamin Netanyahu, que enfrenta acusações de corrupção. “Charutos e champanhe, quem se importa com eles, certo?”, brincou Trump, arrancando risos e olhares confusos no plenário.
A ausência de Netanyahu e o papel dos países árabes
Apesar do convite, Netanyahu não compareceu à cúpula no Egito, alegando o feriado judaico de Simchat Torá. Fontes diplomáticas indicam que sua ausência foi motivada por pressões do presidente turco Recep Tayyip Erdoğan, que teria ameaçado boicotar o evento caso o premiê israelense estivesse presente.
A ausência de representantes oficiais de Israel e do Hamas na assinatura do documento não impediu que o acordo fosse celebrado como uma vitória diplomática. O presidente egípcio Abdel Fattah al-Sisi elogiou Trump como “o único capaz de trazer paz à região”, enquanto o emir do Catar e o presidente da Turquia também destacaram o papel dos EUA na mediação.
Abbas e Trump: um reencontro após oito anos
Outro momento simbólico foi o encontro entre Trump e Mahmoud Abbas, presidente da Autoridade Nacional Palestina. Após oito anos sem contato direto, os dois se cumprimentaram com um aperto de mão e trocaram palavras breves. “É hora de um grande sorriso”, disse Trump, ao posar para fotos ao lado de Abbas e do presidente francês Emmanuel Macron.
Desafios da segunda fase
Embora o cessar-fogo tenha sido celebrado como um marco, especialistas alertam que os desafios reais começam agora. A segunda fase do plano de Trump inclui:
Desarmamento do Hamas, que já sinalizou resistência à entrega total de suas armas.
Governança de Gaza, com a proposta de um comitê de tecnocratas palestinos supervisionado por um “Conselho de Paz” internacional.
Reconstrução do território, estimada em 53 bilhões de dólares, com financiamento liderado por países do Golfo e apoio do Banco Mundial.
Reforma da Autoridade Nacional Palestina, vista como essencial para assumir o controle de Gaza no futuro.
O professor Michel Gherman, especialista em judaísmo e antissemitismo, afirmou que Trump “traiu Netanyahu em sua própria casa”, ao desautorizar sua estratégia de guerra e abrir caminho para um governo palestino em Gaza. “Foi uma clara derrota para a extrema-direita de Israel”, disse Gherman.
Reações internacionais
O secretário-geral da ONU, António Guterres, destacou que as operações humanitárias em Gaza estão sendo ampliadas. “Esses esforços representam um primeiro passo essencial para restaurar a dignidade humana básica”, afirmou.
No Brasil, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva comentou o acordo durante visita à Itália: “O Brasil não tem problema com Israel, tem com Netanyahu. O fato de Trump ter ido ao Parlamento israelense é muito importante. É um começo promissor.”
Acordos de Abraão e o futuro da paz
Trump aproveitou o momento para retomar sua proposta de expandir os Acordos de Abraão, que normalizaram relações entre Israel e países árabes como Emirados Árabes Unidos, Bahrein, Sudão e Marrocos. Ele sugeriu que a paz com o Irã também poderia ser possível: “Acho que eles estão cansados. Só querem sobreviver.”
Contudo, analistas alertam que a paz duradoura dependerá de concessões difíceis. “A solução de dois Estados é a única chance de uma paz verdadeira”, afirmou o professor Paulo Velasco, da UERJ. “Mas não está claro se Israel está disposto a apoiar essa criação.”
Paz ou pausa?
Apesar das celebrações, o cessar-fogo ainda é visto por muitos como uma pausa, não o fim definitivo da guerra. A presença contínua de tropas israelenses em zonas tampão dentro de Gaza e a resistência do Hamas ao desarmamento são sinais de que o caminho para a paz será longo e complexo.
Ainda assim, o acordo representa um avanço significativo. A libertação dos reféns e prisioneiros, o início da reconstrução e a retomada da ajuda humanitária reacendem a esperança de que, após 738 dias de conflito, o Oriente Médio possa finalmente vislumbrar um futuro de estabilidade.