Faleceu, aos 87 anos , João Morais de Souza, mais conhecido como João Carlos, um dos mais notáveis poetas e escritores da cidade de Regeneração, Piauí. Autodidata e com uma trajetória de dedicação à literatura de cordel e à história local, João deixa a esposa, seis filhos – Lucineide, Carlos Alberto, Carlos Augusto, Lucimeire, Morais Souza e Carlos Antônio – além de um legado cultural inestimável.
De acordo com a família, João Carlos faleceu, na manhã desta segunda-feira, 23, no Hospital Casa Mater, em Teresina, dez dias após ter passado por uma cirurgia.
O corpo do poeta foi velado durante toda noite na Câmara de Vereadores de Regeneração, e o enterro está previsto para acontecer às 8:00h, desta terça-feira, 24, no Cemitério São José.
Filho de Zacarias Morais do Rego e Joana Morais de Souza, João Carlos nasceu em 4 de novembro de 1937, em Água Branca. Apesar de ter estudado apenas até a terceira série do antigo primário, ele se destacou pela vasta produção literária e sua habilidade de contar histórias sobre a cultura, os costumes e o cotidiano do sertão e de Regeneração.
Obras Publicadas.

Entre suas principais obras publicadas estão “Revivendo os Velhos Tempos”, “Sertão em Foco” e “Forrozão do Zé do Bode”, todas dentro do estilo da Literatura de Cordel. Em 2011, João lançou o livro “Contos & Fatos: Coisas de Nossa Terra”, uma obra que busca resgatar histórias e lendas da cidade de Regeneração, destacando aspectos esquecidos pela modernidade e pelo tempo. Como ele próprio prefaciou, sua obra é um “rememorar da velha vila”, repleta de contos engraçados e personagens folclóricos.
Uma das histórias mais marcantes de sua obra é “O Vai e Vem do Santo”, que narra de maneira divertida e folclórica o episódio da resistência dos moradores de Regeneração em deixar que o padroeiro São Gonçalo fosse levado para outra localidade. Esse conto exemplifica o estilo característico de João Carlos: uma combinação de humor, memória e preservação da cultura local.

João Morais de Souza deixa um tesouro literário que perpetuará a memória de Regeneração e de seu povo. Sua morte representa uma grande perda para a cultura popular, mas sua obra continuará inspirando as futuras gerações a valorizar as histórias e tradições da nossa terra.
Foram décadas de uma vida marcada pela poesia, pela cultura e pelo amor á Regeneração. Que descanse em paz o nosso querido poeta, João Carlos, cujo talento e amor por sua cidade jamais serão esquecidos.
Vale a pena relembrar uma das histórias mais famosas de Regeneração contadas por João Carlos: São Gonçalo fujão.
~ CONTOS & FATOS – O VAI E VEM DO SANTO~
“Regeneração nunca foi uma cidade violenta, sempre foi calma e ordeira, antes aldeia de são Gonçalo, fundada como tal em 1772 e elevada à vila, com categoria de cidade, em 1882. Foi elevada a categoria de vila, segundo a História, e depois de emancipada como cidade com o nome de Vila de São Gonçalo. Porém, algum tempo depois, por motivos que justificaram sua transferência para as margens do rio Parnaíba, deixou de ser vila de São Gonçalo, e passou a chamar-se Porto de São Gonçalo, antes passagem de São Francisco. E depois passou a chamar – se São Gonçalo Novo. Em 1938, no retorno, pela segunda vez, para seu primeiro lugar de origem passou á denominação de Regeneração. Na mudança foi um Deus nos acuda! Foi grande a revolta! Porque os moradores da vila não gostaram nem um pouco da perda de seu município para outro distrito, embora sendo bem próximo da vila, mesmo assim ninguém queria aceitar a mudança, mas como era ordem do governador da época, não foi possível impedir a tal fato. Mas o pior desta mudança estava por vir, e neste episódio a confusão aumentou consideravelmente.
No meio deste episódio imaginem quem estava lá: o nosso padroeiro, o nosso velho e bom milagreiro São Gonçalo. Isso se deu porque na leva da cidade para as margens do Parnaíba, foi junto o padre da freguesia e, como lá não tinha nem um santo “com competência” para ser o padroeiro da nova cidade, queriam levar o nosso que foi doado pelo primeiro desbravador da aldeia, o senhor Gonçalo Lourenço Botelho que, conforme a História registrou a aldeia com o seu nome e doou o nosso padroeiro. E a confusão não cessava, pois queriam de qualquer jeito levar o nosso santo! e como o povo da vila não dava, com o apoio das autoridades levaram o santo na marra. Mas ficou assim: de dia eles levavam, mas à noite os moradores se juntavam, iam e traziam de volta. E tantas vezes eles levavam, tantas vezes os outros traziam de volta! Daí ficou a dúvida: se era alguém que ia à noite buscar ou se era o seu milagre que o trazia de volta, por não aceitar a nova moradia. E voltava pra velha e pacata moradia! Com tanto leva e traz, o apelidaram de “santo fujão”.
Até que em certo dia, no auge da confusão, um morador de um bairro teve compaixão do nosso velho amigo e pôs um fim à atrapalhação. Levaram o santo pela manhã, mas como já era esperado e certo o furto do santo, à noite aquele homem se antecipou, e foi na frente. Aproveitou um cochilo do sacristão, que era o vigia, e roubou o fujão, levando-o para sua casa e o deixando lá passou vinte e cinco anos, escondido, sem reza, sem velas e sem os movimentos do seu festejo. Só voltou para seu trono, onde vive até hoje, quando veio outro vigário para freguesia. Contudo, mesmo depois deste episódio, a luta pela permanência em sua nova casa, que foi refeita e muito mais moderna, perdeu o seu trono para outro de estatura maior e teve de se contentar com o cargo de porteiro de sua própria casa.
E foi esta a história de nosso santo que ficou, como outrora falei, batizado com o nome de santo fujão, bom velho milagreiro”
