Em um ato sem precedentes, o governo dos Estados Unidos, liderado por Donald Trump, anunciou a revogação dos vistos de entrada de Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), de seus familiares e de outros sete ministros da Corte. A medida, comunicada pelo secretário de Estado Marco Rubio na noite de sexta-feira (18), marca uma escalada na tensão diplomática entre os dois países e levanta preocupações sobre soberania, interferência externa e liberdade de expressão.
O estopim da crise
A decisão americana veio poucas horas após Moraes determinar medidas cautelares contra o ex-presidente Jair Bolsonaro, incluindo o uso de tornozeleira eletrônica, recolhimento domiciliar noturno e proibição de comunicação com diplomatas e outros investigados. A Procuradoria-Geral da República (PGR) justificou as medidas alegando risco concreto de fuga e tentativa de obstrução da Justiça.
Rubio, em publicação na rede social X, acusou Moraes de liderar uma “caça às bruxas política” contra Bolsonaro, afirmando que suas ações violam direitos fundamentais e extrapolam fronteiras, afetando inclusive cidadãos americanos. “Ordenei a revogação dos vistos de Moraes e seus aliados no tribunal, bem como de seus familiares próximos, com efeito imediato”, declarou o secretário.
Quem foi atingido
Além de Moraes, os ministros Luís Roberto Barroso (presidente do STF), Edson Fachin (vice-presidente), Dias Toffoli, Cristiano Zanin, Flávio Dino, Cármen Lúcia e Gilmar Mendes também tiveram seus vistos suspensos. Os únicos que ficaram de fora da sanção foram André Mendonça, Nunes Marques e Luiz Fux.
O procurador-geral da República, Paulo Gonet, também foi incluído na lista, o que gerou forte reação da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR). Em nota, a entidade classificou a medida como “inaceitável tentativa de intimidação” e “ofensa à independência do Ministério Público”.
Reações no Brasil
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva reagiu com firmeza. Em nota oficial divulgada no sábado (19), Lula afirmou que a decisão americana é “arbitrária e completamente sem fundamento”. Ele destacou que “a interferência de um país no sistema de Justiça de outro é inaceitável e fere os princípios básicos da soberania entre as nações”.
A ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, foi ainda mais incisiva: “Essa retaliação agressiva e mesquinha expõe o nível degradante da conspiração de Jair Bolsonaro e seu filho Eduardo contra o nosso país. O Brasil está com a Justiça, não com os traidores”.
A atuação de Eduardo Bolsonaro nos EUA
Eduardo Bolsonaro, deputado federal licenciado e filho do ex-presidente, vive nos Estados Unidos desde março e tem atuado abertamente para pressionar o governo Trump a adotar sanções contra autoridades brasileiras. Em entrevista ao estrategista Steve Bannon,
Eduardo afirmou que Moraes está “desafiando o presidente Trump na frente de todos” e que “o mundo inteiro está assistindo”.
Em suas redes sociais, Eduardo comemorou a revogação dos vistos: “Eu não posso ver meu pai e agora tem autoridade brasileira que não poderá ver seus familiares nos EUA também. Eis o Custo Moraes para quem sustenta o regime”.
Sanções comerciais e pressão internacional
A revogação dos vistos não é o único ponto de atrito. No início de julho, Trump anunciou uma tarifa de 50% sobre produtos brasileiros, incluindo suco de laranja e aeronaves, como forma de protesto contra decisões do STF que afetaram empresas americanas de tecnologia. Plataformas como Rumble e Truth Social, ligadas a Trump, foram alvo de bloqueios no Brasil por ordem de Moraes, o que gerou forte reação nos EUA.
Trump chegou a publicar uma carta em sua rede social afirmando que o Brasil está promovendo uma “caça às bruxas” contra Bolsonaro e que o país estaria se afastando dos valores democráticos. “O grande povo brasileiro não vai tolerar o que estão fazendo com seu ex-presidente”, escreveu.
Soberania nacional
Na decisão que impôs medidas cautelares a Bolsonaro, Moraes apontou que o ex-presidente e seu filho atuaram de forma coordenada para instigar sanções estrangeiras contra o Brasil, com o objetivo de pressionar o STF e interferir no julgamento da Ação Penal 2.668, na qual Bolsonaro é réu por tentativa de golpe de Estado.
O ministro classificou essa atuação como “extorsão institucional” e “atentado à soberania nacional”, destacando que Bolsonaro chegou a condicionar o fim das sanções tarifárias à concessão de anistia judicial.
O que vem pela frente
Apesar da gravidade da situação, o governo brasileiro afirmou que não pretende adotar medidas de retaliação mais duras. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, descartou a possibilidade de controle sobre dividendos ou sanções comerciais, mas indicou que o Brasil poderá recorrer à Organização Mundial do Comércio (OMC).
Especialistas apontam que este é o pior momento das relações Brasil-EUA em décadas. A crise envolve não apenas questões diplomáticas, mas também o funcionamento das instituições democráticas e o respeito à independência dos poderes.